FAVELAS - AS FRONTEIRAS DO PRECONCEITO


Conforme a Organização das Nações Unidas-ONU em seu Relatório “Estado das Cidades do Mundo 2010/2011: Unindo o Urbano Dividido", o "número absoluto" de moradores de favelas cresceu de 776,7 milhões em 2000 para 827,6 milhões em 2010. Só no Rio de Janeiro elas ocupam 3,8% da cidade. 

As favelas são para o senso comum, as maiores responsáveis pelo nível de violência em que vive a cidade. Culpam a sua localização e consequentemente os seus moradores, discutem as consequências, esquecem-se das causas. No caso do Rio de janeiro, o que não se discute é que os seus moradores não ocuparam aquele locais por vontade própria, historicamente as favelas foram construídas para limpar a imagem do Rio de Janeiro e transformá-la em cidade europeia, o que redundou em vários momentos onde determinadas classes, foram expurgadas, jogadas, expulsas a maioria das vezes em nome da civilização, mas que por trás dessa modernização da cidade, houve por parte do Estado vários interesses políticos e econômicos, além de sociais (quanto mais branca a nossa cidade melhor pensava-se após o fim da escravidão), que resultaram no que a cidade é hoje. 

O Estado a partir da abolição da escravatura (1888) e mais nitidamente a partir da década de 1920, através de estratégias formais de controle social tinha o objetivo de implantar um modus vivendi na cidade, garantindo para os brancos uma Cidade Europeia e para os negros libertos e trabalhadores pobres: a Cidade Negra ou Quilombola. Entre 1902 e 1906 ocorreram duas grandes reformas na cidade, com a modernização do Porto realizada pelo Governo Federal e outra pela Prefeitura, a Reforma Pereira Passos.

O Presidente da República, Rodrigues Alves, foi o mentor das reformas urbanas no Rio de Janeiro, objetivava ele que houvesse uma melhora da imagem da cidade para os estrangeiros, a sanidade e a economia da, então, capital federal. Mas havia o interesse, também de modificar o modus vivendi da população, principalmente a negra.

Assim, juntamente com as reformas o prefeito Pereira Passos baixou normas que visavam “civilizar” a população pobre e negra. Havia penalidades para quem cuspisse na rua e nos bondes, para a vadiagem de caninos, fogueiras nas ruas, exposição de carnes à venda nas ruas, trânsito de vacas leiteiras e andar descalço e sem camisa (Brenna, 1985).

A imposição de uma cultura europeia (nos moldes de França e Inglaterra) impactava-se com a presença negra nas ruas: os capoeiras, os biscateiros, carroceiros, vendedores de todos os tipos de animais, vendedores de leite. Assim, viam-se na cidade os “cavalheiros” vestidos de terno e gravata com o sol da cidade a pino dividindo a paisagem com os negros descalços e descamisados.

Com as reformas passaram cada vez mais os pobres e negros a ocuparem os morros e periferias do Rio de Janeiro. Se a cidade europeia não conhecia a Quilombola, o mesmo não poderia se dizer dos últimos que se deslocavam na cidade europeia em função do trabalho.

O que ocorreu naquele momento foi que o controle social (judicial e policial) buscou formas de controlar a massa quilombola e isso foi feito erigindo muros invisíveis entre as duas cidades. Esses muros foram construídos de forma que o local da “ordem” era na cidade europeia e da “desordem” na quilombola.

Os aparatos erigidos pós-abolição, continuaram em 1964, onde um direito penal repressivo reinou acompanhado de uma criminologia Liberal conservadora acrescida de práticas autoritárias (Neder, 1994:36). Nas décadas seguintes o preconceito racial acrescido do preconceito contra a origem geográfica e de lugar aumentaram as fronteiras entre as duas cidades. Uma lição que outros estados podem aprender com o Rio de Janeiro é que as políticas sociais não são para uma parte da sociedade, mas para todos.





















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