O legado do Coronel Negro
A
ascensão do negro em uma sociedade de classes pode ser analisada de diversos
contextos históricos, neste texto analiso a ascensão do Coronel Carlos Magno
Nazareth Cerqueira e como ele influenciou com suas ideias as políticas de segurança
pública em todo o Brasil até os dias atuais.
Cerqueira
adentra o universo político brasileiro em um momento chave para as mudanças que
estavam por vir, era 1983 quando foi convidado para ser o Comandante Geral da
PM do Rio de Janeiro, pelo Governador Leonel Brizola. Nesse momento contava com
29 anos de serviço. Pode-se perguntar o que poderia fazer um oficial negro em
um momento de transição difícil na política brasileira, numa cidade onde os
resquícios da senzala ainda permaneciam nas relações sociais (e permanece).
Discordava
da influência do Exército na administração e organização da Polícia Militar,
para ele era necessário desmilitarizar a segurança pública, ou em suas próprias
palavras: “A desmilitarização que urge acontecer neste setor deve entender a
segurança pública como uma atividade civil submetida aos poderes políticos e
justiça comum”. (Cerqueira: 1999, p.211-224). Entendendo que a PM deveria mudar
a sua prática e deixar de ser “polícia do governo” baseada na Doutrina de
Segurança Nacional para ações que visassem a garantia dos direitos individuais
e principalmente os Direitos Humanos.
A
presença de um negro no Comando da PM causou estranhamento e desconfiança, pois
a imagem do negro para a população carioca era a de favelado e pobre ou de envolvido
em atos violentos enquanto a participação na PM era preponderantemente nas
carreiras subalternas. Estávamos sobre a presidência do General João Batista de
Oliveira Figueiredo (1979-1984) e iniciava-se a transição democrática.
A população ocupava as ruas com passeatas, ondas grevistas, os movimentos sociais avançavam com reivindicações de cunho político e social. Com a valorização e organização da sociedade civil a PM também deveria tomar nova prática em relação às mudanças que estavam acontecendo e que desaguaram, por exemplo, na Campanha das Diretas Já.
A população ocupava as ruas com passeatas, ondas grevistas, os movimentos sociais avançavam com reivindicações de cunho político e social. Com a valorização e organização da sociedade civil a PM também deveria tomar nova prática em relação às mudanças que estavam acontecendo e que desaguaram, por exemplo, na Campanha das Diretas Já.
Foi
então Nazareth Cerqueira o responsável por essa transição a frente da Policia
Militar do Rio de Janeiro. Esteve duas vezes a frente da PM, no período de 1983-1986,
no primeiro governo Brizola, o momento em que ele não aprofundou as reformas
que pensava para a Instituição, pois a conjuntura política e social do momento,
além da resistência interna impediram o avanço e modernização do aparelho
policial.
Mas
isso não quer dizer que não ocorreram avanços, Cerqueira inseriu no contexto da
segurança pública temas como: prevenção no combate ao crime, o entendimento que
o fenômeno do crime é sócio-político e inerente a qualquer sociedade; que a
segurança pública é responsabilidade de todos e que os privilégios no
policiamento não deveriam ocorrer, pois provocaria prejuízos à sociedade, além
das primeiras experiências em policiamento comunitário no Brasil.
Na
segunda passagem pelo Comando da PM, ele já se encontrava aposentado, fato que
não impediu Brizola de chamá-lo para ser novamente o comandante da PM. Foi nessa
passagem pelo governo do RJ que implementou políticas que transformariam em
definitivo o contexto histórico da instituição, além das de cunho interno e
sócio cultural que hoje são compreendidas como muito modernas para a época,
pois eram conjugadas com o respeito aos direitos humanos.
São
implementados no segundo Governo Brizola (1991-1994) como exemplo: policiamento
comunitário em Copacabana; grupo de vigilância nos estádios, Programa Educacional
de Resistência às Drogas-PROERD, Grupamento de Policiamento Turístico. Essas e
outras ações transformadoras influenciaram e influenciam as políticas de
segurança até hoje em nosso país, pois o Coronel Nazareth Cerqueira através de
cientificidade elevou as políticas de segurança pública a tema constante na
academia e a partir de seus textos e publicações erigiram novos debates
enquanto as suas ações mostraram um homem a frente do seu tempo que até hoje é um
exemplo de intelectual negro que não se curvou as adversidades das relações
raciais brasileiras, citado em todos os debates e publicações sérias que
envolvam os temas violência, criminalidade e políticas de segurança pública.
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