UMA RUA CHAMADA VALONGO
Uma descoberta reacende a discussão de como são
mantidos os sítios arqueológicos e históricos no Brasil: a descoberta em março
das ruínas do Cais do Valongo no Rio de Janeiro. Com a chegada dos jogos olímpicos de 2016 a
cidade passa por uma reforma e a zona portuária é um dos locais que precisam
ser embelezados para os nossos turistas. O achado arqueológico foi localizado
entre uma praça, o morro da Providência, o Elevado da Perimetral e a Praça
Mauá, sob a Av. Barão de Tefé.
O Cais do Valongo foi construído em 1758 com o único
objetivo de receber os navios negreiros, suas atividades duraram até 07 de
novembro 1831, pelo menos oficialmente, quando as leis para “inglês ver” proibiram
as importações de escravos. Até 1758 a venda de escravos se fazia ao longo da
Rua Direita, a mais antiga do Rio, mas devido ao estado de saúde dos africanos
e o medo de contágio por doenças foi construído o Cais para que a “cidade
européia” que vivia as expensas do trafico negreiros e do trabalho escravo não
tivesse o seu dia a dia aviltado pela presença do negro, da violência e da
“cidade quilombola”.
O Cais possuía uma rua com o mesmo nome era nessa rua
em que se expunham os escravos para a venda. Maria Graham, em seu Diário de uma
viagem ao Brasil testemunha que: “De ambos os lados estão armazéns de escravos
novos, chamados aqui “peças”, e aqui desgraçadas criaturas ficam sujeitas a
todas as misérias da vida de um negro novo, escassa dieta, exame brutal e açoite
“(apud Lobo: 2008:137). Ao chegarem no Valongo eram contados e taxados na
Alfândega, depois percorriam várias ruas até chegar as casinhas que se
perfilavam ao longo do Cais. Os que não conseguiam pelo menos serem expostos no
Cais, seguiam para a Santa Casa de Misericórdia, local onde eram enterrados
mais de 700 por mês até 1830. O mercado no Cais é fechado em 1831, sendo que a
Enseada de São Conrado e outras praias do Rio continuam recebendo escravos,
sendo mais de vinte mil escravos por ano. (ENDERS: 2009:148-149).
Com a descoberta do Cais e inclusive com os vestígios
encontrados da cultura africana e de afrodescendentes, incluindo cachimbos de
cerâmicas, botões e búzios abre-se mais
um espaço para que se possa discutir a influência da cultura africana e a
relevância do negro na cultura brasileira. Além de mostrar claramente como a
escravidão africana em nosso país foi apagada construindo-se sobre ela o Cais
da Imperatriz e depois ruas e praças, agora o passado volta a tona, como uma
pintura sobre a outra precisamos redescobrir o Valongo, o maior porto de escravos no mundo, não para
relembrarmos o açoite mas para demonstrar a vitória daqueles que construíram
com seu suor e sangue o nosso país.
Referências Bibliográficas:
ENDERS, A. A
História do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: GRYFUS, 2009.
LOBO, L. F. Os
infames da História: pobres, escravos e deficientes no Brasil. Rio de
Janeiro: Lamparina, 2008.
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