O GOLEIRO “ARANHA” NÃO É MACACO

Goleiro Aranha do SANTOS
Mais uma vez o esporte é invadido pela visão distorcida de “torcedores” (será que podem ser chamados assim?) que se acham mais importantes que outros ou melhores por causa da sua cor da pele ou até localização geográfica? O esporte sempre foi um bom exemplo de como as diferentes formas de organização de nossa sociedade se juntam,formando um amalgama quase único. Pois, quando vestidos com a mesma “camisa” do time e juntos torcendo, ninguém pensa em si ou pelo menos o seu corpo não está sozinho em relação aos outros. O corpo de um torcedor não é dele, forma um organismo maior chamado torcida e aí tudo vale: gritos, urros, xingamentos, vaias, etc.

Mas essa cinemática de corpos embalsamados por uma “camiseta” da mesma agremiação formando um corpo único: a torcida,  pode às vezes, conter pessoas que conseguem expor seus pensamentos, frustrações e mesmo utilizar de suas subjetividades e preconceitos para se enaltecerem em cima do “outro”. E este “outro” deixa de ser aquele que pode responder com os mesmos movimentos do corpo e da “massa”, esse “outro” passa a ser molestado não por pertencer a uma agremiação, a um time, a uma torcida, o “outro” torna-se um inimigo que será atingido em sua dignidade e honra pessoal. No caso o futebol tem nos mostrado essa faceta ridícula e infame onde os preconceitos  são chamados à baila para ofenderem o “outro” seja pela sua etnia, raça, posição social, etc. Mas a mais comum nos últimos tempos é a Injúria Racial.

No jogo entre Grêmio X Santos, na Arena Grêmio, pela Copa do Brasil, em 28 de agosto de 2014, às 20 horas, repetiu-se a cena de pessoas emitindo sons e se coçando como macacos para ofender o goleiro do Santos, o Aranha. Neste caso não houve Bananas, como o ocorrido com Daniel Alves, no Barcelona, o nosso Aranha teve que engolir a seco os xingamentos e a mímica imbecilizante, mas de forma forte e firme bateu nos pulsos mostrando que tinha orgulho do sangue que corre em sua veias e o árbitro ao invés de fazer algo, pelo menos diminuir a dor do arqueiro(como nos velhos tempos) ainda o chamou a atenção falando que ele estava incitando a torcida.

Em entrevista o Aranha disse que aguentou “tranqüilo” os xingamentos que são normais no futebol, mas quando começaram a lhe chamar de “PRETO FEDIDO” e “CAMBADA DE PRETOS” e depois imitarem macacos ele não mais aguentou e correu pedindo que um repórter fotográfico filmasse a cena, apontando para as pessoas e “um cara de preto”, mas quando o cinegrafista virou a câmera eles já não faziam mais o gesto. O goleiro ficou indignado e o jogo retornou logo depois.

As reportagens que se seguiram causaram mais incômodo do que vontade de responder ao ocorrido no campo. Um dos representantes do Grêmio estava mais preocupado em falar da expulsão do técnico FELIPÃO do que do ocorrido com o goleiro Aranha. Demonstrando total falta de compostura, dizendo que se identificando o torcedor ele seria punido, mas como?

Na verdade há uma confusão conceitual na forma da imprensa se portar em relação ao crime de Injúria Racial. Na hora, no momento do “evento” o que vemos os repórteres falarem é a palavra Racismo, há uma grande diferença entre o crime de Injúria Racial e o racismo. Primeiramente a Injúria qualificada, no caso e é quando alguém é ofendido quanto a sua dignidade ou decoro, significa injuriar alguém utilizando para isso subjetividades ou elementos quanto a sua cor, raça, etnia, religião, origem, ou pessoa idosa ou ainda portadora de deficiência. No caso do goleiro Aranha do Santos é denominada Injúria Racial (Art. 140, parágrafo 3º do Código Penal). Quanto ao racismo, previsto na Lei 7716/89 é quando alguém deixa de galgar determinado direito impedido pela sua raça ou cor, sendo imprescritível e inafiançável, enquanto a injúria tem pena de reclusão de um a três anos e multa.

Mas a minha didática em explicar a diferença penal é mero caso ilustrativo para diferenciar a forma de como nós pensamos em relação aos pré-conceitos formados em grande parte da nossa História, quase de forma sigilosa ou travestida pelo “mito da democracia racial”, não somos esse caldeirão de misturas étnicas que “deu certo”. Há muitas frentes e fronteiras para serem abertas e muitas feridas que ainda sangram, apesar de que para alguns isso é pura mentira, pois “tem amigos pretos ou sua empregada é preta”. Fico aqui com as palavras do nosso Grande Goleiro do Santos Aranha: “EU SOU NEGÃO... TENHO ORGULHO DE SER NEGÃO!”. Eu também Aranha... Eu também... WS
OBS: Utilizei a alcunha de “ARANHA” intencionalmente, seu nome é Mário Lúcio Duarte Costa.

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